Lembro que em dezembro do ano passado, há exatamente um ano, o Japão aprovava a reforma na Lei de Imigração para receber mais trabalhadores estrangeiros. 

E em abril de 2019 foi criado o novo visto “tokutei ginou”, que pretendia receber 47 mil pessoas no primeiro ano. Sabe quantos entraram no Japão com esse visto nesses oito meses? Menos de 2 mil estrangeiros!

É a velha história que ouvimos também, quando foi criado o visto para os “yonseis” (descendentes de japoneses da quarta geração que vivem no exterior), em julho de 2018. Eram esperados 4 mil “yonseis” no primeiro ano mas foram emitidos menos de 50 vistos chamados “tokutei katsudou”, dentro do qual são inclusos os “yonseis”.

É de se questionar o que está havendo de errado. Como diz o especialista em estudos migratórios, Hiroki Mochizuki, autor do livro “Os dois lados do Japão – A verdade e a fachada do ‘país dos migrantes’”, será que os estrangeiros não vêem vantagem de vir ao Japão e estão escolhendo ir a outros países? 

Se a gente analisar apenas a lei que entrou em vigor este ano, voltada para atrair principalmente trabalhadores asiáticos, não há como negar que parece ter sido uma estratégia política para agradar o setor industrial, carente de mão de obra.

Mas deixando de lado as picuinhas políticas, a verdade é que o Japão já tinha um visto para estagiários asiáticos, o tal do “ginou jisshuusei”. Esses sim aumentaram, e podem passar de 400 mil no final deste ano.

Vamos ver as diferenças que existem entre esses dois vistos:

Visto: “tokutei ginou”

  • Período de permanência: 5 anos (a princípio)
  • Setores de trabalho: 14
  • Conhecimento básico: equivalente à área na qual será empregado
  • Requisito para o visto: conhecimento básico do japonês
  • Possibilidade de troca de emprego: possível
  • Quantidade: eram esperados no máximo 47.550 vistos, mas até 13 de dezembro, foram emitidos apenas 1.732; menos de 3,2% do previsto)

Visto: “ginou jisshuusei”

  • Período de permanência: 1 a 5 anos
  • Setores de trabalho: 81
  • Conhecimento básico: não é necessário
  • Requisito para o visto: nenhum
  • Possibilidade de troca de emprego: impossível
  • Quantidade: 328.360 estrangeiros trabalhavam no Japão com esse visto até o final de 2018; no final de 2019, o número pode superar 400 mil.

No caso do visto para estagiários “ginou jisshuusei”, existem vários problemas que precisam ser repensados. Em 2018, mais de 5 mil empresas foram investigadas por excesso de horas de trabalho e transferência de setor de emprego. Algumas, como a Hitachi e a Mitsubishi Motors chegaram a sonegar impostos gerados por essa mão de obra. No ano passado, 9 mil estagiários simplesmente desapareceram, sem dar justificativas à Imigração. E por aí vai…

São os problemas advindos do “Japão de fachada”: um visto que propõe “ensinar” para que o estrangeiro volte ao seu país com algum conhecimento, mas que na verdade, nada mais é do que uma solução barata para a falta de mão de obra. O mais triste são as consequências que vimos: desigualdade no trabalho, pagamento injusto e até violência (física e verbal) contra esses estagiários.

Se o Japão não olhar o assunto com seriedade, o problema pode piorar. Na minha humilde opinião, o país não precisa de trabalhadores descartáveis – do ponto de vista político – mas sim, cidadãos que possam ser inclusos e que possam contribuir de forma digna. Diferente do Japão de antigamente, a sociedade atual já não precisa mais ter medo de abrir suas portas para receber os imigrantes.

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